sexta-feira, 12 de abril de 2019

Seguindo as pegadas de Peter Pan (Nunca espante um pássaro que rouba um pedaço de pão!)




Olá!

Este post é a continuação da história da primeira fase da vida de Peter Pan, quando ele era um bebê de apenas 7 dias de idade. Decidiu deixar sua casa e voar para os jardins do Kensington Gardens onde ele tinha nascido pássaro, como todas as crianças, e de onde tinha partido para transformar-se em humano nos braços de sua mãe. Assim era o ciclo eterno, de acordo com a história contada por Barrie nesta etapa...

A história, como informei no post anterior, é contada no livro "The Little White Bird", publicado em 1902, mas os capítulos dedicados à Peter Pan foram publicados separadamente num outro livro, em 1906: "Peter Pan in Kensington Gardens".

A história é rica em detalhes, é mágica, é bela, repleta de ensinamentos e, sobretudo, nos proporciona uma maior e melhor compreensão do personagem Peter Pan, mesmo que não haja explicação "racional" para tudo que virá depois. Mas quem quer explicações racionais? Deixemo-nos conduzir pela nossa imaginação; Deixemo-nos vivenciar esses instantes mágicos que tornam a vida mais bela e a alma leve...Deixemo-nos transportar para esse universo impalpável, mas que diz muito sobre nós mesmos e sobre nossos sonhos, sobre a criança que habita em nós. Era isso que Barrie desejava. Era esse o mundo em que ele próprio vivia.

Os acontecimentos que reproduzo aqui não estão necessariamente na mesma sequência do livro, por uma escolha pessoal. Para "saborear" na íntegra essa linda e comovente história, recomendo a leitura do livro, na única edição existente em Língua Portuguesa, publicada em 2015 pela editora Universo dos Livros.

Um dos maiores ensinamentos desta história é que todas as nossas escolhas têm consequências...



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O autor não informa quanto tempo Peter Pan "viveu" na ilha do Kensington Gardens e nas suas adjacências, mas considerando que na próxima etapa do personagem, a peça de teatro que estreou em Londres em 1904 ele é um menino crescido, e considerando também a terceira etapa, como protagonista do romance publicado em 1911, onde aparece como um menino que ainda tem todos os dentes de leite, podemos concluir que Peter Pan "viveu" no Kensington Gardens por, pelo menos, 7 anos. E durante esse período, cresceu...

No Kensington Gardens aprendeu lições valiosas sobre os costumes dos pássaros ensinadas por Solomon, o corvo. Tornou-se grande companheiro e ajudante dos seres alados e era alimentado por eles, que lhe traziam pedaços de pão nos bicos; tornou-se querido entre as fadas:


Fadas tentando ensinar Peter a voar
Ilustração de Arthur Rackham, 1906


Ilustração de Arthur Rackham, 1906

Peter Pan aprendeu a reconhecer os sinais da natureza e a interagir com ela: 


"aprendeu a reconhecer de onde vinha o vento pelo cheiro, podia ver a grama crescendo e ouvir os insetos entrando nos troncos das árvores. Mas a melhor coisa que Solomon havia lhe ensinado era ter um coração alegre. Todos os pássaros têm corações alegres, a menos que você roube seu ninho, e como esse era o único coração que Solomon conhecia, foi fácil para ele ensinar tal lição a Peter."

Conheceu sua primeira amiga, a menina Maimie, para quem as fadas construíram uma casinha em torno dela. Foi Maimie que deu um dedal a Peter, como se fosse um beijo - ela lhe pediu um, mas ele demonstrou não saber  o que era um beijo, e casualmente Maimie tinha um dedal no bolso -. (Veja nota 1)

Peter contou a Maimie todas as suas aventuras entre a ilha e os Jardins, apaixonou-se por ela e a pediu em casamento, dizendo:


"- Sabe por que eu amo você? É porque você se parece com um lindo ninho."



Mas Maimie não se casa com Peter... ela retorna para sua mãe, após um longo diálogo sobre o assunto e outros acontecimentos.

Maimie retornou aos Jardins várias vezes até se tornar uma mocinha e deixava presentes para Peter, acompanhados de cartas onde ela ensinava como usá-los e foi Maimie quem deu a ele a cabra imaginária que ela criara para assustar seu irmão Tony.

Peter construiu uma flauta de juncos para poder ser musical como os pássaros e

"costumava se sentar na orla da ilha, no entardecer, e juntava em sua flauta o sussurro do vento e o som das águas com o brilho intenso da lua, tocando de forma tão bela que mesmo os pássaros se confundiam e perguntavam uns aos outros se era um peixe na água ou Peter tocando o som de um peixe em sua flauta. Às vezes ele tocava o nascimento dos pássaros, e as mães se reviravam nos ninhos para ver se tinham colocado algum ovo."

Ilustração de Arthur Rackham, 1906

Sua natureza meio humana e meio pássaro permaneceu, mas ele ainda não voava, não mais depois de ter saído de sua casa e, como dissera Solomon, ter perdido a fé...

Deslocava-se de um lugar para outro dentro de um ninho gigante que os Tentilhões (ou Tordos, depende da tradução que se tenha em mãos) construíram para ele:

Ilustração de Arthur Rackham, 1906

A vela do ninho foi feita com o que sobrou da camisola de Peter Pan! Os pássaros adoravam usar os fios da camisola para fazer seus ninhos e pediam a ele a todo instante, ao ponto em que o pequeno ser ficou praticamente nu, então Solomon o aconselhou a guardar o que havia sobrado da camisola... E a sobra transformou-se em vela para seu "barco"

Era uma criança feliz o tempo todo, não sentia frio ou tristeza e estava sempre em atividade, pois os ensinamentos de Solomon incluíam outra lição:

"sempre estar fazendo algo e acreditar que, o que quer que esteja fazendo, tem grande importância."

Uma das partes mais tocantes do livro é quando as fadas concederam a Peter o direito de fazer um pedido que elas realizariam... Tal direito foi concedido "por ele tocar tão lindamente".
Sim, Peter era o animador das festas das fadas e nos convites que eram distribuídos havia as iniciais do nome dele para que todos soubessem que ele estaria presente com sua flauta e sua bela música.

"E foi assim que aconteceu. A Rainha ordenou que ele se ajoelhasse e, (...), ela lhe concederia a realização do seu desejo mais sincero. Assim, todos se reuniram à sua volta para lhe ouvir o desejo, mas por um longo tempo ele hesitou, sem saber ao certo o que desejava.

- Se eu escolher voltar para minha mãe - ele, por fim, perguntou -, você poderia me conceder tal desejo?

A pergunta incomodou a todos. Afinal, se ele voltasse para sua mãe, não haveria mais música. A Rainha, então, mexeu o nariz e disse:

- Oras! Faça um pedido de verdade.

- Isso é muito pouco? - ele questionou.

- Pequenino assim - a Rainha respondeu, aproximando uma mão da outra.

- E de que tamanho é um pedido grande? - ele perguntou.

Ela mostra o tamanho de sua saia, e era uma medida realmente grande.
Peter Pan refletiu e disse:

-Bom, então, acho que tenho dois desejos pequenos em vez de um grande.

Claro que as fadas tinham de aceitar, embora sua astúcia as tivesse surpreendido; assim, ele disse que seu primeiro desejo era voltar para sua mãe, mas com o direito de voltar aos Jardins. O segundo pedido ele deixaria guardado para depois.

Tentaram dissuadi-lo e até colocar empecilhos.

- Posso lhe dar a capacidade de  voar até a casa dela - a Rainha disse, - Mas não posso abrir a porta para você.

- A janela de onde saí voando estará aberta - Peter disse, confiante. - Minha mãe sempre a deixa aberta na esperança de que eu voe de volta.

- E como você sabe disso? - perguntaram, um tanto surpresas.

Peter, realmente, não fazia ideia de como ele sabia daquilo.

- Eu apenas sei - ele disse."

E então Peter voou até sua casa...
Ele encontrou a janela aberta e viu sua mãe adormecida...
O que acontece, então, é comovente e não vou transcrever aqui. Deixo a sugestão de que leiam o livro.
Peter permanece no quarto de sua mãe por algum tempo e parte novamente para os Jardins; parte com um grande dilema em seu coração, mas havia decidido que voltaria em definitivo para os braços de sua mãe...
Ao retornar à ilha Peter começa uma longa série de despedidas: dos amigos e dos lugares que conheceu e amava. Fez sua última viagem de barco.
Mas muito tempo se passou nesse processo... muitas noites e muitos meses... 

Solomon ficou profundamente incomodado com isso, pois Peter estava incentivando a procrastinação entre os pássaros!

Ele costumava dizer:

"Nunca deixe para amanhã o ovo que você pode botar hoje"
e
" Não há segundas chances neste mundo."

Então, finalmente Peter revela às fadas seu segundo desejo e, de fato, era o que elas mais temiam ouvir:

"- Desejo voltar para minha mãe hoje e para sempre."

Quando Peter chega novamente à janela de sua mãe ele a encontra, para sua surpresa, fechada e com barras de ferro...
Tentou, em vão, chamar a atenção de sua mãe, mas ela não o ouvia... Ele espia pela janela e a vê adormecida, abraçada a outro garotinho...

Então Peter, chorando, voa de volta aos Jardins e desde aquele dia nunca mais viu sua mãe.

"Solomon estava certo, não existe segunda chance, não para a maioria de nós."

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Até o próximo post!
Beijo
Ju






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Notas:
(1) Essa cena se repetirá no romance de 1911, mas a menina será Wendy.

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